segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

" O ano em que morreu o rei Uzias". - Isaías 6:1.


O ano em pauta é apontado como 735 a.c. Poucas coisas importantes aconteceram fora da história de Israel ou que tivessem a ver com o povo: Início do reinado de Candaules (também chamado de Mirsilo, filho de Mirsos), último rei da Lídia da dinastia dos heráclidas; campanha dos assírios aos pés do Monte Nal, contra Urartu. Mas em Israel, foi quando Uzias morreu.

Uzias começou a reinar com 16 anos e reinou 52 anos em Jerusalém. Era também  conhecido como Azarias. Uzias significa " força do Senhor" e Azarias, seu outro nome, "Deus ajudou" , praticamente um sinônimo em termos de significado,  ou dois nomes que comunicam mensagem semelhante.  O que sabemos de seu governo é que reorganizou o exército de Israel; reconstruiu as fortificações da cidade de Jerusalém;  alcançou vitórias retumbantes sobre os filisteus; destruiu as cidades inimigas de Gate, Jabna e Azôto; conquistou Elate;  derrotou os árabes e subjugou os amonitas. Durante seu longo governo o país experimentou prosperidade. Manteve-se fiel ao culto do Deus de Israel e tornou-se famoso entre as nações vizinhas por causa de suas constantes vitórias. Promoveu a agricultura; construiu torres no deserto e abriu poços de irrigação. Foi um rei voltado à engenhosidade e duas gerações de israelitas vivenciaram as benesses do seu reinado. Foi graças ao seu governo que o reino de Judá se libertou da tirania de Jeroboão rei do reino do norte, Israel.

A expressão " o ano da morte" como datação da experiência do profeta, inclui a morte ou não? Ou seja, o rei já havia morrido ou a revelação se deu antes do fato? O texto de Isaías 6 favorece o entendimento de que o trono havia sido substituído. Jotão estava há dois anos governando interinamente por conta da doença do seu pai que o afastara do trono. Logo, com a morte do rei, é provável que Isaías estivesse preocupado com a sorte do reino e Deus lhe mostrou que o verdadeiro Rei estava assentado no Seu trono, não importando quem estivesse ocupando o trono na terra. É possível que o profeta estivesse fazendo uma evocação memorial do significado ou impacto daquela morte, como o lamento de um luto. Afinal, os anos longos de seu governo eficaz traziam o registro impactante de que " Ele fez o que o Senhor aprova... e buscou a Deus durante a vida de Zacarias, que o instruiu no temor de Deus. Enquanto buscou o Senhor, Deus o fez prosperar" (II Cr. 26: 4). E fazendo juz ao significado dos seus dois nomes: " ...ele foi extraordinariamente ajudado, e assim tornou-se muito poderoso e a sua fama espalhou-se para longe" (II Cr. 26:15). A morte de um rei que fizera tal história, com certeza deixaria marcas de um luto profundo, mesmo não tendo  terminado bem os seus dias. Dos cinquenta e dois anos que reinou, os dois últimos foram passados em retiro por conta de uma lepra que lhe veio como juízo de Deus contra sua soberba, que subiu ao seu coração por conta de seus muitos sucessos. Mas a memória de seu reinado eficaz por meio século suplantou a má lembrança de dois ínfimos anos.

Não podemos deixar de ler com certa reverência a expressão do profeta. Seu propósito era situar na história o momento marcante do que parece ser o início de seu muito longo ministério profético, ocorrendo a partir de uma visão impactante. Com certeza sua experiência se deu num dia qualquer da semana de um mês conhecido, mas, embora fosse usual desde os dias de Moisés registrar-se a data pelo dia, mês e ano, o profeta situou sua marcante experiência no ano que seria memorial para toda uma nação: o ano em que o rei Uzias morreu, como se aquela morte houvesse durado o ano todo, um ano inteiro. Penso que foi quase exatamente assim, considerando-se que Uzias estava enfermo já há dois anos. O povo amava seu rei, e por certo esperava sua cura, a reversão do juízo de Deus. Esse ano em particular deve ter sido um ano de muita expectativa e vigilância, que tornou longos todos os seus muitos dias.Toda aquela geração que lesse a história de Isaías se daria conta desses dois grandes eventos: a morte de um grande rei, e a unção de um grande profeta. Seria um ano inesquecível.

Penso em quão significativo é que a morte de um ser humano possa marcar o calendário por tornar-se evento inesquecível. Inesquecível não pela comoção de uma tragédia, mas por conta da memória de uma vida.

De Jeorão, rei, foi dito quando morreu: " Foi-se sem deixar de si saudades". Que triste epitáfio!
A Bíblia pontua certas mortes cujo lamento parece apontar ao fato de que a pessoa em questão deveria viver mais ou ir bem além, como o caso de Dorcas, um membro da igreja em Jope, por cuja morte o pranto das suas amigas moveu o apóstolo Pedro a clamar por sua ressurreição. Mas entendo que Uzias conta entre aqueles cuja vida faz da morte um memorial saudosista, porque vivem, à semelhança de Abel, de tal forma que sua fé, " depois de morto ainda fala".

Pensar que fomos chamados à existência para que nossa fé continue nossa proclamação após nossa saída da História, deveria nos levar a refletir com mais sensibilidade e consciência sobre o rastro que nossa caminhada está deixando após si, dentro de nossa geração.

Acredito que mais nobre do que a notícia de que nasceu um homem, e aí ele é inevitavelmente tão pequeno, é o anúncio de que um grande homem (mulher) partiu. De tal forma que se se esquece local e data de seu nascimento, o impacto de sua memória fica ecoando após sua partida. Esta deve ser também a forma como pretende Deus que a fé no coração de cada crente continue falando, marcando vidas, depois que tiverem deixado a terra.

Para mim, este ano que se finda será o "ano em que morreram Laércio, dona Dina e dona Hermínia"', servos do Deus Altíssimo, inesquecíveis em nossa saudade.


Pr. Cleber Alho.