sexta-feira, 16 de outubro de 2015

SEMIOLOGIA ESPIRITUAL




Semiologia, na área da saúde, é a ciência que se serve de sinais (sintomas, queixas), para avaliar um quadro patológico. É uma ciência rica, complexa e vasta, mas seu ponto de partida ou uso mais comum, tanto na medicina quanto nas ciências psicológicas é avaliar a partir dos sintomas para se chegar a uma hipótese diagnóstica. Na psicanálise a semiologia é vasta, e o profissional dela se servindo, “ouve” o discurso encoberto do sujeito a fim de delimitar uma área patológica nos substratos intrapsíquicos segundo os sinais que correspondem grosso modo a algum tipo de padrão.

A fé, por sua vez, tem sua própria semiologia. Por exemplo, o Senhor Jesus estabeleceu estas máximas semiológicas: “Por seus frutos serão conhecidos por vocês (Mateus 7:16) e: A boca fala daquilo que está cheio o coração(Mateus 12:34). Mas há outros sinais que nos servem para mensurarmos a saúde espiritual ou integridade de um crente em Cristo. Transcrevo abaixo o texto na íntegra, de I João 2: 28 a 3:10 segundo a versão de Eugene Petersen, A Mensagem. Convido você a lê-lo para perceber os sinais de um novo nascimento, um cristão autêntico, e então neles identificar a si mesmo(a).

“Agora, filhos, permaneçam com Cristo. Vivam plenamente em Cristo, e estaremos prontos quando Ele Se manifestar, prontos para recebê-Lo de braços abertos, sem motivo de vergonha e sem desculpas esfarrapadas.

Uma vez que vocês estão convencidos de que Ele é correto e justo, não terão dificuldades de reconhecer que todos os que praticam a justiça são os verdadeiros filhos de Deus.

Que amor maravilhoso o Pai nos concedeu! Vejam só: somos chamados ‘filhos de Deus’! É o que realmente somos. Mas é por isso também que o mundo não nos reconhece nem nos leva a sério, porque não tem idéia de quem Ele é ou do que pode fazer.

Mas, amigos, é exatamente isto que somos: filhos de Deus. E é apenas o começo. Quem pode dizer como será o fim? O que sabemos é que, quando Cristo finalmente Se manifestar, nós O veremos – e, então, seremos como Ele. Todos os que esperam Sua vinda devem estar preparados, tendo como modelo a pureza gloriosa da vida de Jesus.

Os que não se importam com a vida de pecado fazem uma perigosa oposição à Lei de Deus, porque o pecado é uma grande ruptura da ordem divina. Vocês sabem que Cristo Se manifestou para eliminar o pecado. Não há pecado nEle, e o pecado não faz parte do Seu projeto. Ninguém que viva profundamente em Cristo vai fazer do pecado uma prática. Quem vive na prática do pecado nunca se voltou para Cristo, mas virou as costas para Ele.

Por isso, meus filhos queridos, não permitam que ninguém desvie vocês da verdade. Quem age corretamente é correto, como o que vemos no justo Messias. Os que fazem do pecado uma prática são do Diabo, o pioneiro na prática do pecado. O Filho de Deus entrou em cena para destruir os caminhos do Diabo.

Os que foram concebidos e trazidos à vida por Deus não fazem do pecado uma prática. Como poderiam? A semente de Deus está no íntimo do seu ser, fazendo deles o que são. Não é da natureza dos nascidos de Deus praticar e ostentar o pecado. Vou dizer como diferenciar entre os filhos de Deus e os filhos do Diabo: quem não pratica a justiça não é de Deus, tampouco quem não ama seu irmão. Simples assim.

Conseguiu identificá-los? Quantos você percebeu? Eu identifiquei oito deles. 

Deus nos abençoe com misericórdia sobre todos.

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

O INSANO E A INSANIDADE DOS SÃOS



"E chegaram ao outro lado do mar, à província dos gadarenos.
 E, saindo ele do barco, lhe saiu logo ao seu encontro, dos sepulcros, um homem com espírito imundo; o qual tinha a sua morada nos sepulcros, e nem ainda com cadeias o podia alguém prender; porque, tendo sido muitas vezes preso com grilhões e cadeias, as cadeias foram por ele feitas em pedaços, e os grilhões em migalhas, e ninguém o podia amansar. E andava sempre, de dia e de noite, clamando pelos montes, e pelos sepulcros, e ferindo-se com pedras. E, quando viu Jesus ao longe, correu e adorou-o. E, clamando com grande voz, disse: Que tenho eu contigo, Jesus, Filho do Deus Altíssimo? conjuro-te por Deus que não me atormentes (Porque lhe dizia: Sai deste homem, espírito imundo). E perguntou-lhe: Qual é o teu nome? E lhe respondeu, dizendo: Legião é o meu nome, porque somos muitos. E rogava-lhe muito que os não enviasse para fora daquela província. E andava ali pastando no monte uma grande manada de porcos. E todos aqueles demônios lhe rogaram, dizendo: Manda-nos para aqueles porcos, para que entremos neles. E Jesus logo lho permitiu. E, saindo aqueles espíritos imundos, entraram nos porcos; e a manada se precipitou por um despenhadeiro no mar (eram quase dois mil), e afogaram-se no mar. E os que apascentavam os porcos fugiram, e o anunciaram na cidade e nos campos; e saíram muitos a ver o que era aquilo que tinha acontecido. E foram ter com Jesus, e viram o endemoninhado, o que tivera a legião, assentado, vestido e em perfeito juízo, e temeram. E os que aquilo tinham visto contaram-lhes o que acontecera ao endemoninhado, e acerca dos porcos. E começaram a rogar-lhe que saísse dos seus termos. E, entrando ele no barco, rogava-lhe o que fora endemoninhado que o deixasse estar com ele. Jesus, porém, não lho permitiu, mas disse-lhe: Vai para tua casa, para os teus, e anuncia-lhes quão grandes coisas o Senhor te fez, e como teve misericórdia de ti.nE ele foi, e começou a anunciar em Decápolis quão grandes coisas Jesus lhe fizera; e todos se maravilharam." - Marcos 5:1-17

Há uma quantidade nada pequena de contrastes de situações  e comportamentos nesta narrativa.

Começo chamando a atenção para o fato de que o povo de Gadara se viu debaixo de duas manifestações transcendentais com efeitos visíveis em seu mundo físico. E penso que a segunda foi provocada pela primeira: demônios e a divindade na Pessoa de Jesus. Simultaneamente as presenças do inferno e do céu, do mal e do bem.

A presença do mal no homem de Gadara não ficou isolada, condicionada a ele. Não. A população estava afetada por ela, eu diria, vivendo uma comorbidade. Se por um lado a presença malígna ficou condicionada a uma única pessoa, estava circunscrita àquela população, que vivia incomodada e inquieta. O endemoninhado impedia o curso de alguns caminhantes; incomodava com seus berros de desespero, e eles tentaram confiná-lo, prendendo-o a grilhões que nada podiam contra sua força sobre-humana. E se tentavam prende-lo, decerto era porque tentavam conte-lo, mante-lo sob controle para salvaguardarem-se de seus atos violentos. Ademais, ele, perturbando os sítios dos sepulcros, lhes impedia acesso àquele espaço onde certamente algumas famílias precisavam chegar, extemporaneamente. Uma coisa é sabida: O desespero daquele homem impedia-lhes a paz, comprometia o sossego da população toda de Gadara. Vê-lo restrito ao cemitério da cidade, não representava alívio nem o  estarem livres de sua perturbação.

Com efeito sabiam que o que se passava com ele era uma operação do mal, ambiência demoníaca. Deveria ser desconcertante e desconfortável saber: "há um demônio entre nós". E um, pelo simples fato de não terem ainda a informação de que aquela infeliz criatura era o hospedeiro de uma multidão de demônios em seu único corpo. De qualquer forma, por mais desconcertante fosse a convivência, eles iam tocando suas vidas cotidianamente, cuidando da sua criação de porcos. Homens "sãos" tentavam conciliar seu convívio com a insanidade. E aqui temos mais uma excessão do equilíbrio: cercados por terras judaicas em que prevalecia a observância da Lei de Moisés que proibia aos judeus comer carne de porco, reputada por imunda, como deveriam ver-se e sentir-se os gadarenos circundados por seus vizinhos judeus? Não deveria ser uma convivência fácil ou prazeirosa. Criadores de animais imundos, seriam com certeza reputados por imundos eles mesmos, da parte dos judeus.    

Mas, somos surpreendidos pela informação de que o Reino de Deus presente na Pessoa de Jesus Cristo, adentra à terra previamente invadida pelo mal. Jesus vai de Cafarnaum a Gadara, depois de atravessar pelo Lago de Genesaré. Nenhum morador da cidade vai ao seu encontro, pois os homens "sãos" não O conhecem. Em vez disso, é recepcionado pelo endemoninhado que sai ao seu encontro com brados violentos. Demônios falam por sua boca. Estão desesperados porque reconhecem o Filho de Deus que tem sobre eles total autoridade. Confrontados, confessam-se milhares num único corpo humano. Penso nessa mente sob milhares de delírios e angústias! E Jesus os expulsa. Entram, com sua permissão, nos corpos de dois mil porcos que desarvorados precipitam-se monte abaixo até o lago onde se afogam. E aqui uma nota de realce: a capacidade da mente humana suportar tamanho desvario por tanto tempo sem se desintegrar. Era de se esperar que aquele homem fosse levado a suicídio ou desatino semelhante. Pelo menos em nossa sociedade moderna fazemos a leitura pelo viés do preconceito religioso reputando suicidas por endemoninhados. E endemoninhados é como a sociedade reputa todos cujo comportamento assume formas bizarras e de excessão, em especial no terreno da violência. De certa forma, aquele insano preservava sua vida a despeito das trevas que o dominavam em desespero.

Estou convencido de que Jesus forçou sua passagem por Gadara, para dar àquele povo a opção da presença do Bem em face do Mal. E creio que essa é a forma da graça divina sempre atuar. Se o mal se manifesta, a graça não se omite, não o deixa sem resposta, pois como disse Paulo: "onde o pecado abundou, superabundou a graça". Mas os gadarenos, cientes do Mal, não se aperceberam da presença do Bem.

Importa saber que o insano ficou são. Somos informados de que ele de imediato se tornou um adorador do Filho de Deus, em plena posse de seu juízo. E nos alegramos com a notícia de que Jesus o comissiona como evangelista e de que ele, ato contínuo, parte para cumprir sua missão por toda a cidade.

É quando somos tomados pela perplexidade. O homem liberto anuncia o extraordinário milagre que se operando nele, liberta por conseguinte todo o povo, agora livre daquele desconcertante flagelo. Mas, até onde percebemos, não foi a mensagem dele que atraiu a atenção dos gadarenos, e sim, a mensagem dos porqueiros que levaram ao povo a notícia de duplo comunicado: o perturbador da paz está liberto, e sua libertação custou o prejuízo da perda de dois mil porcos da produção da cidade.

A insanidade toma conta dos "sãos" que contabilizam o prejuízo, não o preço de sua paz e sossego. Perder tais bens é inadmissível. Conviver com o insano é possível. Impossível é sofrer perda, qualquer que seja, ao custo de sua cura.

Levados à presença do causador da bênção que gera perda, temem Sua presença e decidem: "deixe-nos! Sai dentre nós! Preferimos a presença do mal à ausência de nossos bens e ganhos, ainda que tenhamos de vivê-los em meio ao tormento". De quantas perdas mais seriam passíveis se Jesus continuasse entre eles? Quanto custaria a cura da insanidade de mais alguns? Quantas vezes mais?

Penso que o consentimento de Jesus à súplica dos demônios para que os deixasse entrar nos porcos aponta para nós que o Filho de Deus quis marcar a consciência de valores daquela gente, como se os levasse a medirem até onde ia essa consciência no pesar o valor de uma vida humana. O que fica em foco não é o animal, o porco, mas a representação de seu significado espiritual à luz da Lei que era tudo a que aquela gente tinha de acesso como conhecimento da vontade de Deus. Se a Lei os prescrevia como imundos, por que insistiam os gadarenos em lucrar com a criação deles? O que estava em foco era o desvalor em que aquele povo tinha a Lei de Deus que era Sua palavra revelada até então.

Insanos os gadarenos? Seriam mesmo só os gadarenos?

Sabemos que a invasão do Reino de Deus em nossas vidas e lares, sempre custa o preço do aniquilamento de alguns bens, alguns deles porcos, ainda que não parcos. Muitas vezes para que o mal saia, algumas coisas porcas precisam ir-se juntamente. Mas tais coisas são reputadas por valiosas, por bens de tal ordem, que a libertação parece causar um mal maior. Algumas estão comprometidas por afetos questionáveis, e por serem afetos, caros, portanto. Assim pais, homens e mulheres de bem, vão preferindo a ausência de Jesus à presença do mal, porque expulsar os porcos fica-lhes caro demais. Mesmo quando o custo a pagar é apenas frustrar alguém com um simples NÃO. Às vezes esses porcos estão na sala de estar, através de uma mídia comprometida com a imoralidade e desvalores. Outras vezes nas amizades contratadas à custa da moral e da decência. Outras mais, na troca de compromissos com o Reino de Deus por programas sociais e familiares que nada acrescentam nem edificam, e por aí afora. Mas no fim sempre estabelecendo um grau de desprezo ou descaso para com a Palavra de Deus no trato cotidiano.

Deixam-nos os gadarenos a lição de que sua insanidade era mais louca que a do homem sob grilhões, pois que ela os levou a preferir porcos à Palavra viva de Deus. Aquele, no entanto, em seu juízo perfeito, preferiu a Jesus. Os "sãos" O preteriram. Provaram por fim quem, verdadeiramente, eram os insanos.

Perder alguns porcos, mas limpar filhos para Deus, não é insanidade. Morram os "porcos", mas vivam os homens e sejam apresentados ao mundo como filhos de Deus, sãos e salvos.